quinta-feira, 10 de março de 2011

HISTÓRIAS QUE AGENTE OUVE

Depois de uma longa parada, consegui chegar até o computador para contar um historinha, dessas que agente ouve por aí. Historinha boba, mas que tal tirar dela alguma lição? Quem sabe não encontremos resposta para muitos porquês disso e daquilo que vemos acontecer com os outros e porque não, com nós mesmos?

-E aí, seu Tião, ainda trabalhando na roça?
-Pois então, eu gosto de trabalhar fora. Vou contar para a dona, não suporto ficar em casa por dois motivos: Primeiro é que perdi a uns dois anos atrás, a minha mulher; ela que era a luz da minha vida, minha alegria .
-Que bom que vocês viviam bem. -
-Pois é dona, a minha esposa tinha o maior cuidado comigo, cozinhava muito bem, e quando a comida ficava pronta, era sempre eu que começava a servir. Nunca deixou de cuidar de mim, era minha companheira, eu sempre tinha com quem conversar...Agora que ela morreu, não tenho mais alegria de ficar em casa.
-o senhor não tem filhos?
-Sim, eu tenho oito filhos. Um deles morreu afogado quando era jovem, e os outros sete não querem nem saber de mim. Agora quando fazem a comida, se eu não ficar esperto, não sobra nada para mim. Se acaso eu não volto para casa, ningúem sequer vai até o quarto pra saber se eu tô vivo ou morto.Eles não querem me ver por perto. O segundo motivo é que o meu caçula tá usando essa tal de droga, e vive me roubando . Eu durmo com a carteira presa no corpo. Não combinamos de jeito nenhum. Se eu facilito, ele até me bate. Por isso é que eu gosto de trabalhar fora.
-Pois é, seu Tião. Mas por outro lado, o senhor agora pode ficar bem . Não precisa dos seus filhos pro seu sustento. Estou sabendo que o senhor tem duas aposentarias, nem precisa desse dinheirão todo. Aposto que tá fazendo uma boa poupança.

Bom até naquele ponto eu estava diante de um senhor de mais de setenta anos de idade, Com uma família criada em meio a muitas lutas, tinha perdido a esposa, a luz de sua vida, como ele dizia, e agora, como se isso não bastasse, era praticamente posto pra fora da sua própria casa, Pensei nessa história como muitas que agente houve por aí, e olhei aquele senhor franzino, pegando a enxada toda a manhã, faça chuva ou faça sol. Pensei na injustiça dos filhos em relação a ele. Um pai cançado, ja velho, tendo que ainda trabalhar para ter onde morar.
-Mas seu Tião, o senhor não precisa mais trabalhar assim .
-Sabe, Dona, os meus amigos dizem que o que acaba comigo é a gandaia. Estando na rua, não saio do bar da Lena. Eu tô enrolado é com umas muié. Elas levam todo o meu dinheiro. Só com uma tal fulana, eu tô enrolado... ja faz uns nove anos. E olha que ela é esperta demais, pega muito dinheiro.
Quase caí o queixo! -Nove anos? Mas seu Tião, o senhor só está viúvo a dois anos... O senhor era casado!
-Pois era!- Foi o que ele respondeu com um riso safado. Olhei para ele e só consegui falar: -Tá bom, Seu Tião, então o senhor não era fácil.

Nesse momento eu entendí o que a Bíblia conta sobre sodoma e gamorra. Os homens não sabem como sofrem e ficam perguntando Por quê? Será que é tão difícil assim, agente perceber em que ponto da nossa vida se perde o fio da meada e constrõem o próprio calvário? Não tenho o menor direito de julgar esse senhor e nem quero. Primeiro porque ele nem de longe se julga criador do momento atual de sua vida. Assim como ele, em sua simples história, nós outros também ocultamos de nós mesmos esses fios perdidos da meada, esses momentos em que uma plantação por menor que seja, responde lá na frente, nos cobrando caro a estrutura falida. Por um sorriso que deixamos de dar, por um abraço que negamos dentro do lar. Por fim as consequências, que a maioria enfrenta e nem sequer percebe que foi causa própria. Só algum dia com o despertar da verdadeira conciência se poder fazer uma varredura na própria história, e então analisar o que passou. Tanto pro seu Tião, como para 90% dos restantes esse momento ainda parece estar muito longe.

Nenhum comentário:

Postar um comentário